Jacarezinho é um bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro onde está localizada a favela do Jacarezinho. Faz limites com os bairros Jacaré, Manguinhos e Benfica. Nas imediações está a Avenida Dom Hélder Câmara, um dos principais eixos viários da Zona Norte, com aproximadamente 11 km.
Entre os anos de 2017 e 2021, foram relatados no local 204 tiroteios para a plataforma Fogo Cruzado. No Rio, a violência, a falta de acesso à educação, saúde, saneamento básico presentes nas favelas são decorrentes de um processo histórico de falta de investimento social e econômico nesses territórios e moradores. Mas a partir dos dados de secretarias municipais atuantes no Jacarezinho, vemos também que a violência recente influencia a qualidade dos serviços públicos no local.
A violência tem consequência direta na disponibilidade e no acesso de serviços públicos no Jacarezinho e outras favelas do Rio de Janeiro. As análises apresentadas neste especial mostram que o impacto da insegurança já começa na dificuldade de coleta de dados de moradores de favelas, cujas realidades dependem ainda mais de políticas públicas baseadas em evidências. Os dados mostram também a relação direta da violência com o desempenho dos estudantes, com a atuação das equipes de saúde da família e com a garantia de saneamento básico. Além disso, é evidente o impacto da segurança pública na transparência de dados sobre favelas do Rio de Janeiro. Parte dos dados que serão apresentados foram omitidos ou generalizados para preservar a segurança da população e dos servidores municipais que trabalham no local. Apesar de ser adequado neste caso, a falta de uma transparência total dos dados impede uma analise mais desenvolvida dos serviços públicos no Jacarezinho.
Segundo os dados do Censo do IBGE, em 2010, o bairro do Jacarezinho tinha uma população estimada de 37.839 habitantes. Contudo, existe um questionamento sobre o quanto a contagem populacional realizada pelo IBGE consegue ser eficaz em territórios de favela. Dentre as diversas questões levantadas, a principal delas é o fato de muitos domicílios não serem efetivamente recenseados, seja por falta de pessoal, seja pela dificuldade de acesso, por questões de segurança e pelo aumento do controle dessas áreas por grupos armados. A falta de uma contagem efetiva e atualizada dos habitantes do Jacarezinho dificulta a identificação das características do território e o desenvolvimento de análises que colaborem para a definição de políticas públicas.
Na tentativa de superar essa classificação e conseguir retratar a favela de forma realista, diversas organizações buscam quantificar a população das favelas do Rio de Janeiro. Segundo a Associação de Moradores do Jacarezinho, em 2021, a estimativa era de 90 mil habitantes na favela. Em 2022, o Instituto Pereira Passos identificou 13.767 domicílios no território.
O bairro do Jacarezinho e os bairros vizinhos, Jacaré e Manguinhos, possuem 19 unidades escolares identificadas no Censo Escolar 2020 e nos dados da Secretaria Municipal de Educação (SME), entre as quais Cieps, escolas municipais, creches e espaços de desenvolvimento infantil.
Segundo a SME, 19 escolas da região atendem 2.180 crianças do Jacarezinho.Em 2019, último ano com 200 dias letivos completos, as 19 escolas tiveram juntas 93 fechamentos por motivos de operações policiais ou outra situação de violência. O território possui duas Unidades Escolares da 1ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) que juntas fecharamtrês vezes durante o ano letivo de 2019, oito UEs da 3ªCRE com 50 fechamentos e noveUEs da 4ªCRE com 40 fechamentos. A secretaria informou que o nome das escolas não pode ser divulgado por motivos de segurança da equipe escolar, o dado é sensível e pode vulnerabilizar as equipes gestoras.
Com base nos resultados da Prova Brasil 2019, é possível calcular a proporção de alunos com aprendizado adequado à sua etapa escolar. Nas escolas e cieps municipais dos três bairros analisados, apenas duas escolas tiveram uma proporção de alunos maior que 50% que aprenderam o adequado na competência de leitura e interpretação de textos até o 5º ano na rede pública de ensino (55% e 54%) e nenhuma teve uma proporção de alunos maior que 50% que aprenderam o adequado na competência de resolução de problemas. Nas escolas municipais do Rio de Janeiro, a proporção de alunos que aprenderam o adequado em portugues é de 57% e matemática é de 46%.
A pesquisa “Tiros no Futuro: Impactos da guerra às drogas na rede municipal de Educação do Rio de Janeiro”, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), revela que, em 2019, estudantes do 5º ano de instituições com entorno violento, que registraram 6 ou mais ocorrências de operações policiais, têm uma redução média de 7,2 pontos no desempenho em língua portuguesa e 9,2 em matemática. Considerando o ganho médio anual de proficiência esperado, ''a exposição à violência resulta em uma perda de 64% do aprendizado esperado em língua portuguesa e, em matemática, a perda é de todo o aprendizado que o aluno deveria adquirir nessa etapa de ensino'', analisa a pesquisa.
O Jacarezinho possui duas unidades básicas de saúde (UBS), Clínica da Família Anthidio Dias da Silveira e o CMS Renato Rocco. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, a CF tem uma população cadastrada de 26.824 pessoas e possui sete equipes de saúde da família, uma equipe de consultório na rua e duas equipes de saúde bucal. Já o CMS tem população cadastrada de 16.252, com duas equipes de saúde bucal e quatro equipes de saúde da família.
Apesar das equipes de agentes comunitários cobrirem 92% da população, segundo a SMS, em alguns dias de 2021, os ACS da unidade não conseguiram realizar seu trabalho devido à insegurança da região.
No CF, durante o ano de 2021, as atividades externas (visita domiciliar, ação na escola, etc) foram suspensas durante oito dias e em 169 dias houve suspensão de atividades externas em parte do território, que indica que determinada equipe não pode acessar todo ou parte do seu território, enquanto há equipes que podem acessar o território e manter as atividades externas programadas. Além disso, dois dias a unidade precisou ser fechada durante parte do dia e em quatro dias houve um fechamento total da unidade.
Já no CMS Renato Rocco, as atividades externas foram suspensas durante 18 dias e em 163 dias houve suspensão de atividades externas em parte do território. Em 2021, não houve fechamento parcial da unidade, mas foram cinco dias de fechamento total.
Até janeiro de 2022, devido à insegurança do local, os veículos da Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) só acessavam as parte externas do bairro do Jacarezinho. A partir de fevereiro, depois da implementação do programa de ocupação do governo estadual Cidades Integradas, a Comlurb passou a expandir a atuação no território.
Segundo a Companhia, o serviço Coleta de Lixo Domiciliar em Comunidades passou a ser oferecido e, com o fortalecimento da segurança pública, será possível implantar um programa de coleta regular de lixo duas vezes por semana, contratar mais 20 garis comunitários e instalar 60 caixas de coleta de lixo com capacidade para 1,2 mil litros no Jacarezinho.
Com mais segurança pública nos territórios, o município consegue expandir e melhorar a qualidade dos serviços públicos. Para além da Comlurb, a Prefeitura do Rio anunciou um pacote de ações de melhorias para a favela do Jacarezinho. Dentre elas, construir uma creche padrão no modelo de Espaço de Desenvolvimento Infantil (EDI), implementar uma nova unidade de Clínica de Saúde da Família para cobrir 100% da população e realizar outros serviços de assistência social, urbanização e conservação.